Nosso período é definido por aquilo que veio a ser chamado de “deriva emocional”, a preferência dada ao sentimento sobre a razão e às paixões em relação à inteligência. Nossa sociedade colocou a emoção em primeiro lugar. O resultado disso é o impedimento de qualquer discussão genuína, já que o debate civilizado exige certa moderação, uma perca momentânea do juízo, com o objetivo de permitir que as partes se entendam. Nosso tempo, em vez de ser a era do “diálogo”, da “abertura” e do “pluralismo”, não é senão a era do slogan, do espírito obstinado ao ponto da repressão, do pensamento uniforme. Pode-se colocar assim a questão (se é que vale propô-la): “Como chagamos a um tal impasse social e cultural?”.
É nesta questão que esta obra se endereça indiretamente. O cristianismo antigo priorizava a verdade doutrinal, a discussão intelectual pormenorizada, a controvérsia, a refutação sistemática dos erros. Por conta disso, foi uma poderosa ferramenta educativa, um fator essencial para o desenvolvimento de uma alta civilização na qual a conversão, a discussão e o ensino desempenhavam um papel social eminente.
Mas com a influência – que hoje se tornou predominante no mundo religioso – daquilo que nossos autores chamam de “misticismo”, é a emoção que passou a dominar. A comunhão com Deus pela mediação do Verbo tomou um caminho inesperado e mortal, isto é, o caminho da fusão, da união irracional, da confusão intelectual, moral e espiritual. Afinal, é evidente que não se pode provar uma emoção experimentada, de maneira que não é possível fazer dela objeto de uma discussão. Num outro momento, a verdade guiava a vontade, conduzindo-a a uma emoção genuína, matizada e forte. Hoje em dia, entretanto, uma emoção-pulsão indiferenciada assumiu a precedência, movendo arbitrariamente nossa volição, ao passo que a razão é relegada a uma função conveniente: justificar ideologicamente as aberrações de uma emoção carnal desenfreada;